domingo, 12 de janeiro de 2014

Direito ao aborto: por uma legislação sem restrições

Escrevi este texto para o Blog da Marcha Mundial das Mulheres, por ocasião do 28 de setembro, dia latino-americano e caribenho de luta pela legalização do aborto.

Direito ao aborto: por uma legislação sem restrições

O ano de 2013 não tem sido fácil para a garantia dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres. Foram inúmeras as tentativas das forças conservadoras em violar esses direitos seja através de projetos de lei como o “Estatuto do nascituro”, seja pela ofensiva em vetar a lei, sancionada pela presidenta Dilma, que garante atendimento a vítimas de violência sexual ou ainda pela massificação, principalmente nas redes sociais, de um discurso “pró-vida”, na qual a vida da mulher é o menos importante.

Grande parte desses fatos traz o aborto na centralidade de uma disputa que deve se intensificar ainda mais em 2014. É forte a possibilidade do tema voltar à pauta eleitoral graças à conjuntura política que se mantem refém das forças conservadores em prol de uma governabilidade.

Nesta semana em que se aproxima o 28 de setembro, dia latino-americano e caribenho de luta pela legalização do aborto, é preciso fazer a reflexão de que o debate sobre o aborto está longe do entendimento de que o assunto é um direito a ser legalizado e sim, deve ser tratado como caso de saúde pública, sendo função do estado prover o aborto seguro e gratuito.

Argumentos provenientes de valores machistas, misóginos e de uma moral religiosa impedem que o Brasil avance na legalização do aborto. A lei que regulamenta o aborto, que data de 1940, ainda é extremamente restritiva quanto a esse direito, tornando criminosa a mulher (e apenas a mulher) que pratica o aborto. Há raríssimas exceções. O direito é concedido apenas em casos em que a vida ou a saúde da mãe está em risco, em casos em que a gravidez é proveniente de violência sexual ou quando é comprovado anencefalia (má formação congênita no cérebro).

Embora haja tamanha restrição, o aborto é uma realidade no país. A Pesquisa Nacional do Aborto realizada em 2010 pela Universidade de Brasília (UnB) revela que uma em cada sete brasileiras entre 18 e 39 anos já realizou ao menos um aborto na vida. Ao menos um quarto desses procedimentos levam a complicações pós-abortamento que podem levar as mulheres a ficarem estéreis ou terem a saúde comprometida por toda a vida. A cada dois dias uma mulher morre no país decorrente da prática insegura. Muitas dessas mortes não são contabilizadas nos números da mortalidade materna do país, o que dificulta uma resposta a nível de políticas públicas para este indicador.

Experiências em países como o México e o Uruguai onde a legalização do aborto é uma realidade, o número de mulheres que morrem caiu drasticamente. No Uruguai, esse número chegou a zero. Segundo dados oficiais daquele país, não foi registrada a morte de nenhuma mulher que abortou de forma regulamentada entre dezembro de 2012 e maio de 2013. É preciso ressaltar que o aborto não é um método contraceptivo, ele é o último recurso para se impedir uma gravidez indesejada.

No Brasil, uma legislação sobre a interrupção voluntária da gravidez ainda carece de uma ampla e profunda discussão entre a esfera governamental, o legislativo federal e a sociedade, em especial as mulheres, detentoras dos corpos e das vidas. Entretanto, é necessário ficar atentas aos projetos que tramitam no legislativo sobre o tema.

Há inúmeros deles que versam sobre a questão do aborto. Esses projetos podem ser divididos em categorias como: os que propõem aumentar as restrições atuais, aqueles que querem reduzir as restrições ou que tratam o aborto de forma acessória. Há aqueles em que o caso é tratado meramente como uma ação individual, não dando nenhuma garantia de assistência médica às mulheres. Há ainda projetos como o “Estatuto do Nascituro” em que o sujeito pleno de direito é o óvulo fecundado, passando a ter mais direitos do que as mulheres.

Neste 28 de setembro, é preciso sair às ruas para reafirmar que a luta no Brasil é por uma legislação que conceda amplos direitos para as mulheres, separando a sexualidade da reprodução. O aborto tem de ser uma escolha da mulher, sem que haja qualquer tipo de constrangimentos e violências de ordem moral, psicológica, ética e médica recaia sobre elas. Além disso, sobretudo, é preciso parar essa epidemia de mulheres morrendo em consequência de abortos clandestinos. É preciso dizer: legalize, é pela vida das mulheres!

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