sábado, 19 de maio de 2007

O Quarteirão da Saúde

SERVIÇO de clínicas populares cresce em Fortaleza. Foto: Isabelle Azevedo

Por Aurimar Monteiro e Isabelle Azevedo

Pouco antes do sol nascer e encher Fortaleza de saúde, inúmeras pessoas começam a chegar à Rua Doutor João Moreira, no centro da cidade, em busca de atendimento médico barato. É ali, bem ao lado da Santa Casa, que está localizado o chamado "quarteirão da saúde", nome dado à meia dúzia de clínicas que funcionam a preços populares.

O serviço de consultas populares começou há seis anos, com a instalação da Clínica São Paulo, a maior e mais bem estruturada das clínicas. Depois, inúmeros outros consultórios médicos foram se estabelecendo no mesmo quarteirão, bem ao lado de uma grande variedade comercial como depósito de reciclagem, motéis, barbearia, pequenos bares e lojas de artesanato. A vizinhança parece conviver em harmonia. Mas, vez por outra, é possível ouvir as "meninas" que batem ponto próximo ao motel reclamar da pilha de gente que chega todos os dias aos estabelecimentos. "Esse pessoal das clínicas ficam (sic) tudo em cima da gente, aí na porta do motel, ficam tudo em cima das putas", reclama uma delas ao bicheiro de plantão, o "tio do Paratodos".

As clínicas funcionam em pequenos prédios onde as salas são divididas por paredes de madeira e cedidas a médicos autônomos pelo dono de cada consultório. O aparente improviso do ambiente não os desqualifica. O lugar é organizado e limpo. A única ressalva feita é ao calor insuportável que toma conta da recepção e é comum a todas elas. O apelo religioso é visível em cada estabelecimento médico. O paciente pode, por exemplo, procurar o "caminho da cura" junto a Santa Clara, pedir intercessão a Nossa Senhora das Graças ou simplesmente orar próximo aos inúmeros crucifixos expostos nas paredes das clínicas. Nem sempre é preciso agendar a consulta; caso ainda haja vagas para a especialidade desejada, basta chegar e pagar um valor que varia entre vinte e cinco e trinta reais, dependendo de cada lugar.

Os pacientes são oriundos dos mais diferentes bairros de Fortaleza. Há gente que vem do interior e até de outros estados. Muitos não chegam a procurar um posto de saúde. Outros procuram as clínicas populares insatisfeitos com o serviço público oferecido. "SUS é algo que colocaram na cabeça da gente", afirma Eli Ribeiro Domingues, paciente que pela segunda vez procura o serviço popular. Eli mora em Manaus onde, segundo ela, não existe médico. De férias em Fortaleza, ela aproveita o preço acessível para fazer exames com o marido. "No ano passado meu marido fez uma série de exames em uma clínica particular de Manaus e gastou R$ 1.200. Aqui, na clínica popular, ele gastou R$ 300", afirma comparando os preços com o atendimento privado.

SERVIÇO: Clínicas Populares. Rua Dr. João Moreira, próximo a Santa Casa. Preço: R$ 25 a R$ 30.


(Confira o texto na íntegra na segunda edição do Jornal Cidade em Pauta que deverá ser distrubido já na próxima semana)

Atendimento popular se espalha pelo Brasil

O sistema de clínicas populares avança como uma alternativa para a população de baixa renda que recusa esperar pelo atendimento do SUS e para a classe média sem condições de pagar as altas mensalidades propostas pelos planos de saúde.

O Ceará não foi o primeiro a oferecer o sistema popular. O estado de Pernambuco é pioneiro na abertura de consultórios populares. O serviço começou a ser oferecido em 1994 com a instalação da primeira clínica no bairro do Ibura, em Recife. Na época, o paciente pagava cinco reais pela consulta médica. A idéia deu tão certo que, em 2000, o modelo de consultas médicas populares já era comum em toda a região metropolitana.

Em Salvador, o modelo também faz parte de quem busca alternativa ao atendimento do SUS.Segundo o Jornal Tribuna da Bahia, nos últimos anos, as clínicas populares multiplicaram-se ao longo dos prédios da rua Chile e da avenida Sete de Setembro onde, outrora, estavam instaladas clinicas de médicos famosos que atendiam a classe nobre da sociedade baiana.

Para muitos especialistas, o modelo de clínicas populares é também uma alternativa para as clínicas médicas credenciadas pelo SUS que já não conseguiam se manter com os baixos valores repassados para o pagamento de médico e a compra de materiais necessários para a manutenção das clínicas.