domingo, 11 de março de 2007

O amor e suas formas


"O coração tem mais quartos que uma pensão de putas!"
Florentino Ariza em O Amor nos Tempos do Cólera

Q
uando as obras literárias são boas, logo ganham vários fãs, são reeditadas inúmeras vezes, viram grandes adaptações cinematográficas (nem sempre tão boa quanto à obra original), são premiadas e tornam-se obras atemporais, admiradas e reverenciadas por várias gerações. Este parece ser o caminho que vem sendo trilhado pela obra “O amor nos tempos do cólera” (El amor em los tiempos del cólera), do autor colombiano Gabriel García Marquez.

Publicada em 1985, a obra de Gabo ganhará uma adaptação cinematográfica que deverá estrear agora em 2007. É uma grande homenagem a um dos melhores escritores do mundo e que foi agraciado há 25 anos com o Prêmio Nobel de Literatura.

Em “O amor nos tempos do cólera”, Gabo narra a estória de amor mais bonita do século XX: a paixão de Florentino Ariza por Fermina Daza. Durante a adolescência, os protagonistas chegam a trocar apaixonadas correspondências, até mesmo quando o pai de Fermina a envia ao interior, na esperança de que a distância pudesse impedir o amor entre eles.

Apesar dos esforços do pai, é Fermina quem resolve a situação. Ao encontrar-se pessoalmente com Florentino, as palavras encantadoras de outrora, presente nas cartas de amor, são substituídas pela valorização da beleza física. Florentino logo é tachado de feio e excêntrico. Surge, então, a figura bonita e jovial de Juvenal Urbino que se tornaria marido de Fermina, até o reencontro desta com Florentino, 50 anos depois.

Mas a estória não é tão simples quanto parece. Apesar de deixar um pouco de lado o realismo fantástico tão marcante em Cem Anos de Solidão, Gabo cria uma narrativa densa, mas ao mesmo tempo simples, para falar das várias formas de amar e da possibilidade de exercer, ao mesmo tempo, as formas do amor. A narrativa é enriquecida por inúmeras estórias agregadas ao enredo principal e por construções lingüísticas encantadoras. Os protagonistas vão ganhando uma complexidade maior à medida que envelhecem e é preciso despir-se de preconceitos para compreende-lhes as necessidades, as manias e as esquisitices.

Florentino Ariza é sem dúvida a personagem melhor construído por Gabo. Ele é a própria personificação do amor e se encarrega de nos apresentar com grande profundidade e sem pressa as nuances desse nobre sentimento. Do amor verdadeiro ao amor por prazer, parece não haver restrições para Florentino, o importante é amar, ainda que demore mais de 50 anos para ser verdadeiramente amado. Já Fermina Daza apresenta-se como uma mulher a frente de seu tempo, mas que vai ganhando certa passividade ao longo da estória à medida que vai se firmando como matriarca dos Urbinos. Talvez, uma crítica do autor ao casamento.

O título do livro também é interessante. Ao relacionar amor e cólera, o autor qualifica o sentimento como uma doença, capaz de deixar seqüelas ou mesmo fazer morrer uma vida inteira. Também aproxima esse sentimento a outro bem antagônico: a raiva ou o ódio. É esse antagonismo que marca, por exemplo, o relacionamento de Urbino e Fermina.

Nesses tempos onde a dúvida acerca dos valores amorosos predomina, O amor nos tempos do cólera é uma ótima leitura para quem busca descobrir a verdade sobre a vida, conhecer a essência do amor, e a aceitar o amor seja qual for a sua forma.

Serviço: O Amor nos tempos do cólera, Gabriel García Marquéz. Editora Record,1985, 439 páginas.

Isabelle Azevedo

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